A filosofia, assim como a religião, precisa tanto da morte quanto a ciência precisa do seu determinismo. A morte é a musa da filosofia, já nos disse, entre outros, o senhor de Montaigne, e também é a razão de existir da religião e da ciência, eu acrescentaria. Sem essa certeza, não há a menor possibilidade de continuarmos, por assim dizer, vivendo, e isso porque, se parássemos de morrer, toda a estrutura cultural se desmoronaria – e não por conta do que seria permitido ou proibido, isso é uma outra questão –, mas porque sem a morte não saberíamos o que fazer da vida; nem saberíamos o que seria a vida. A morte é o que nos designa enquanto seres vivos: os seres vivos são aqueles que um dia morrem; e a ciência dela – da morte – é o que nos diferencia dos animais e nos proporciona o aparato necessário para construirmos todo um sistema de crenças, de respostas e de ilusão baseado na garantia de que um dia não mais seremos, de que um dia chegará onde nossas dores e nossa angústia se encerrar